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Porto de Pedras, Alagoas, 2019. |
Acho curioso ver nas páginas do caderno um pouco de farinha, respingos, chocolate, diferentes cores de caneta, mas pincipalmente, os comentários: “ótimo”, “deu certo”, “um pouco seco”, e por aí vai. Mais interessante ainda, é que as receitas ganham nomes das pessoas que cozinharam ou criaram: Biscoitos Amanteigados da Tia Leda, Bolo de Abacaxi – ótimo – da Líria, Pudim da Vizinha da Vilma, Torta de Nozes da Sandra. Quando fui morar sozinha, o caderno ficou com a minha mãe e, sempre que quero alguma receita, peço pela receita da fulana, e nunca “aquele bolo de chocolate”.
Acho lindo como as receitas ganham identidade e personalidade, é isso o que faz gerar tanto afeto.
Às vezes, acho que não sou muito boa com as palavras para expressar sentimentos, mas entendi que a minha maneira de fazer isso é cozinhando. O tempo, o cuidado, a escolha dos ingredientes, a dedicação quando preparo os doces, principalmente, são a minha forma de demonstrar afeto. É uma coisa forte energeticamente, enquanto o bolo assa, fico emanando energia para que cresça bem, fique bom e as pessoas gostem. Já aconteceu de ter que fazer um doce para alguém que não tenho grande afeição e a receita simplesmente desandou. Não tem como ser diferente, culinária é afeto, amor, é a concretização disso tudo.
Parte do meu processo de autoconhecimento é entender a minha relação com a culinária. Testar receitas é meu momento de relaxamento, mas também é quando enxergo minhas inseguranças, afinal, o objetivo é deixar os outros felizes, levar conforto em forma de comida. É como gostar mais de dar presentes do que receber. Por isso, quero que esteja tudo sempre perfeito.
Claramente vejo como sigo o caminho da minha mãe, que seguiu o caminho da minha avó. Ela conhece os pratos preferidos de meus melhores amigos, de toda a nossa família e, muitas vezes, estes pratos se tornam o carro-chefe da minha mãe: mil-folhas, nhocão, bannoff, pavlova, bolo de morango gelado, torta de nozes. Assim, a gente vai construindo nossa história e relação com as pessoas e, consequentemente, com a culinária.
"Comer não é apenas alimento. É sentir emoções, descoberta, memórias, viagens e partilha. Seja bem-vindo ao Amor”. Essa frase estava na primeira página do cardápio do restaurante Amor, em Porto de Pedras, onde fui com a Tati em 2019. Pra mim, é isso.
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Torta de nozes da Sandra, do caderno da minha mãe |
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Quem escreve
Marinna é potiguar, mas já morou em tantos lugares, que dá pra dizer que ela é curitibana-canadense-carioca-paulista. Por enquanto, é produtora audiovisual, trabalha e vive no Rio, mas um dia vai abrir uma cafeteria comigo. Faz os melhores bolos e doces que comi na vida. Nunca acha que estão bons o suficiente. Confia em mim e fala com ela.
4 Comentários
Que texto lindo! Quero ir na inauguração da cafeteria! ❤️
ResponderExcluirCarinho nas memórias...
ResponderExcluirGrande receita de afeto. Bjim
ResponderExcluirAmei o texto... A paixão pelo tema - a culinária - nos faz nos apaixonar um pouquinho mais pela comida também. Adorei :)
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