A graça de ir a um festival de
cinema é conhecer diretores e filmes que não chegariam a você de outra forma.
Claro, hoje existe a internet e seu arsenal infinito de possibilidades, mas se
não investigar nos sites dos festivais, nos blogs e revistas de quem estuda e
escreve sobre o assunto, acabamos num limbo de inúmeros nomes, países,
cinematografias e nenhum guia para se orientar.
Este ano, o Festival
Internacional de Cinema do Rio de Janeiro traz uma mostra de Grandes Mestres.
Dentre estes, está Hong Sang-soo, diretor sul coreano de A Visitante Francesa (2012), Ha
Ha Ha (2010), entre outros. Para a minha sorte ou azar, não conhecia nada
dele, nem mesmo estes citados e mais conhecidos e fui ver o mais recente, Right now, wrong then (2015), que já
visitou os festivais de Toronto e Locarno.
O diretor é um dos queridinhos dos festivais internacionais e por onde passa,
causa um alvoroço do quilate de Woody Allen, Polanski ou Almodóvar.
O filme conta a história do
encontro do diretor de cinema Ham Cheon-soo (Jae-yeong Jeong), que visita uma
cidade para exibir seu filme e comentá-lo, com uma pintora, Yoon Hee-jeong
(Min-hee Kim), que cruza seu caminho. Passam um dia juntos em uma conversa
que vai criando intimidade entre eles, até seu desfecho. E aí, acontece
toda a graça, quando as sequências se repetem, como em Feitiço do Tempo (1993, Harold Ramis) e não só vemos a
transformação dos protagonistas, como suas mudanças de atitudes que convergem
para um novo destino. Esse jogo narrativo é tão divertido quanto conciso e nós,
por não termos amplo conhecimento da dramaturgia e cinematografia sul coreanas,
somos pegos desprevenidos no jogo de cena. É muito divertido perceber as
sutilezas entre as sequências – enquanto no filme americano elas são mais
óbvias pelo número de repetições, aqui as variações quase passam despercebidas,
a começar pelos títulos. Somos convocados para um jogo que se aprofunda e nos
deixa pensando em nossas atitudes quando em novos encontros. Quem estamos
mostrando para o outro? Somos nós ou uma versão mais ou menos agradável a
depender do recebemos em troca?
O cinema estava cheio e se
dividia entre silêncio e algumas gargalhadas, especialmente de dois vizinhos
meus. Acabei sendo contagiada pelo riso deles, o filme saiu delicioso e me vi
gargalhando junto. As interpretações dos atores parece estranha, especialmente
no personagem do diretor, Ham. É algo como uma caricatura de um homem que
encontra uma bela mulher e não sabe como reagir a ela nas duas sequências. Os
exageros se traduzem tanto como a inocência, inibição frente a uma paixão recém-descoberta,
quanto em um sentido de comédia quando tenta seduzi-la, em falas entrecortadas com
expressões que nos parecem mais insegurança do que conquista. Já a pintora Min
se equilibra entre uma personagem tímida, ingênua e, ao mesmo tempo,
observadora, tentando entender com questionamentos diretos, qual a densidade de
seu parceiro.
Acompanhando a crítica oficial de
Locarno e Toronto, o que se confirma nesse filme é um cinema de autor, que
repete as fórmulas com um adendo de inovação e criatividade narrativas, como em
Woody Allen ou qualquer grande mestre. Alguma coisa na cinematografia, nos
planos escolhidos – à exceção talvez do zoom, que não se vê tanto em comédias
românticas – remete ao cinema francês, mais leve e sutil, deixando a cargo dos
atores a ação, ao invés de fragmentá-la em uma montagem mais frenética. O fato
é que esta inusitada e estranha surpresa nos resgata das histórias tragicômicas
de nossos próprios quase relacionamentos para este novo, com cara de romance de
um tempo que não existe mais. Agora é
correr para tentar ver o outro filme do diretor que está no Festival, A
Montanha da Liberdade (2014). É, sem dúvida, um bom e divertido início para a
maratona cinematográfica deste ano.
*Esta crítica está no Blah Cultural! :)
3 Comentários
eu curiosamente também mudei bastante a minha opinião ao pensar sobre o filme depois, essa ingenuidade e espécie de timidez acabaram me cativando. e desde o início achei o zoom um artifício muito interessante e bem cinema francês, mas talvez com mais cara de godard; para não nos deixar esquecer que estamos num filme, numa realidade construída. acho acaba funcionando bem com a divisão em duas sequências, também.
ResponderExcluirenfim, depois falamos mais pessoalmente e estou ansiosa para acompanhar as próiximas críticas! (:
Rapaz, eu tenho a impressão que esses coreanos sempre tem uma atuação meio esquisita... Você viu aquela série do Netflix, Sense8? A coreana principal era boa atriz, mas o resto dos coreanos... Eles tinham uma atuação meio forçada, como você disse, caricata, exagerada, estranha.
ResponderExcluirApesar da atuação diferente dos coreanos (vai que não é atuação estranha, vai que são eles que se expressam daquele jeito mesmo) fiquei curiosa em ver o filme. Também nunca tive a oportunidade de ver nenhum filme de Hong Sang-soo, na verdade acho que nunca vi nenhum file coreano (aquele old boy é coreano? Se bem que eu também não vi Old boy então whatever hahahahaha), mas quem sabe esse não o meu começo também?
Sense8 tem um pouco disso também, cê tem razão. Não tive muita paciência pra série, ela não me pegou. Achei enrolado demais o início, do tipo "já entendi que eles compartilham o pensamento, vamos em frente, pelamordedeus!!". hehehehehe... Um dos filmes que comentei no texto, A Visitante Francesa, tá no Netflix. Assim que acabar a maratona do Festival, vou assistir. Acho que vale ver esses filmes de do outro lado do planeta, justamente por serem do outro lado do planeta! Vamos dar uma variada na vida, né? Adorei te ver comentando aqui, baby! :D
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