Crítica: Love 3D, Gaspar Noé

by - setembro 07, 2015

Amor é um filme francês de 2013 que levou não sei quantos prêmios para casa e é uma das produções que fala mais honestamente sobre o sentimento, levado até o fim e extremo do que se espera dele. É um filme duro e difícil, mas ao mesmo tempo, terno, honesto, amoroso. Dói assistir.


Amor (Love 3D) é também o novo filme de Gaspar Noé que causou comoção em Cannes esse ano, agora em 3D. Polêmico como o outro, mas tendo no sentimento um olhar singular, o diretor buscou expô-lo através do sexo, porque essa conjugação produz a melhor sensação que se pode ter na vida, de acordo com seus personagens. Gaspar Noé é o criador também de Irreversível (2002), um filme de desespero e ódio de um homem que busca vingar a mulher estuprada. Tenso até o fim, violento e brutal, esse nos deixa sem piscar e nos provoca não sei quantos sentimentos.

Love 3D é um filme jovem. A história é sobre Murphy (Karl Glusman), entre seus 20 e tantos anos que recebe uma mensagem de voz da ex-sogra preocupada com a filha Electra (Aomi Muyock), de quem não tem notícias há 2 meses. A garota, após terminar o intenso relacionamento com o protagonista, pede que lhe deixe para sempre. Em sua casa, Murphy vive com o filho e Omi (Klara Kristin), a mulher que engravidou, enquanto vivia com Electra. Agora, Murphy relembra todo o relacionamento que teve com aquela que ainda ama e de quem hoje nada sabe.


O filme tem algumas considerações que tentam sustentar a trama, como o mito de Electra (ou o complexo de Édipo para a mulher) e Murphy com sua lei. Electra deixa claro sua posição com relação ao pai ao não querer apresentar o novo namorado, pois este não seria bom o suficiente e ela não queria passar a informação de um relacionamento com outro homem que não seu progenitor. Murphy então, literalmente nos abre a revelação que funciona apenas como um aposto à história, já que não é utilizada para nada mais que não a construção de uma personagem complicada, intensa e em formação, indicando que de fato há uma questão amorosa e complexa na relação de pai e filha, com e para Electra – que não nega e tampouco desenvolve o assunto no decorrer do filme. 

Murphy, por sua vez, é o reflexo da lei criada pelo dono do nome no fim dos anos 40 – quando se diz que se alguma coisa tem a mais remota chance de dar errado, certamente dará. Então, ele sofre com a ausência de Electra e a possibilidade de algo muito ruim ter lhe acontecido, devido ao seu caráter errante e descontrolado.

Uma história simples, sem grandes atores – talvez a que se destaque seja exatamente aquela que não vive mais ali – cuja polêmica é percebida pela quantidade de cenas de sexo explícito e em 3D na tela. O que no início pode nos deixar excitados como um filme pornô com grande fotografia e corpos lindos, nos anestesia gradualmente e toda a força das cenas perde impacto. 

Conhecendo Gaspar Noé, é clara a intenção de perturbar a plateia sempre que possível e essas cenas nos provocam em grande escala, desde o estímulo visual que aquece o sangue a um escândalo de violência como o filme anterior que nos leva na direção oposta, do asco e horror. Ao mesmo tempo, as cenas onde a intimidade surge – não falando de sexo aqui – são as mais bonitas e interessantes, que ajudam a construir o relacionamento deles como algo plausível que tenta corroborar aquele amor. Aqui sim, há a grande beleza, nos silêncios compartilhados, no companheirismo, no que há de extraordinário do convívio cotidiano – pena que não há um equilíbrio entre os dois pólos para trazer mais interesse e estrutura à trama.

Talvez o filme valha a pena para saciar nossa curiosidade na feitura das cenas de intimidade, pela beleza e sinceridade com que se apresentam e foram feitas – é sexo, é explícito e é 3D. Por outro lado, a ausência de aprofundamento e a longa duração, nos tiram um pouco desse prazer voyeur e quase entediam.


Talvez seja esse o ponto, então. Talvez a ideia seja essa mesmo de praticarmos juntos a experiência pura do cinema, traduzindo seu objeto de desejo primeiro – a satisfação do olhar – da forma mais conhecida que é a curiosidade pela volúpia, aqui traduzida literalmente neste voyeurismo de um filme erótico – quase uma redundância metafórica para os cinéfilos. Juntos numa sala de cinema – por sorte a minha estava vazia – haverá uma mistura de sensações, desde o acanhamento ao sentar-se ao lado de um desconhecido, até um prazer compartilhado que será manifestado no íntimo de cada espectador – um duplo do erótico pelo erótico e o prazer sentido como uma experiência compartilhada. Será sempre numa sala de arte, para um público específico – ou curioso simplesmente – e de fato, interessante. Os desavisados sairão da sala. 

Não fosse longo demais, talvez assistisse novamente neste contexto e observaria os olhares às primeiras cenas, enquanto ainda estamos atentos e animados. O fato é que a justificativa da obra – de que deveríamos ver mais sobre amor e sexo da forma como acontecem na vida real, ao invés de reforçar uma grande história, traz exatamente o oposto: apenas uma desculpa para trazer sexo bem filmado aos cinemas. Fosse um pouco mais desenvolvido narrativamente como o Amor anterior - de poucas palavras - ganharia nas discussões polêmicas que não se voltam apenas para a questão sexual, mas para a franqueza da intimidade tratada realisticamente numa tela grande.

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