O tronco de Drummond

by - junho 12, 2008

Conheço uma pessoa que resolveu morar só. Juntou uma grana, comprou o apartamento e saiu da casa dos pais. Chegando na nova morada, encontrou no meio do seu processo de adaptação, um tronco de árvore à altura de sua janela. O tronco estava liso como sua árvore que, morta de aparência, era toda tronco e raiz que não se vê.

Também resolvi que ia morar só. Como não tinha grana suficiente, aluguei um apartamento e me mudei. O meu tronco é o Carlos Drummond de Andrade. O poeta está morto como o tronco, só se vê sua estátua à beira da praia, sentada num banco. Como o tronco, Drummond está cercado de vida. Como meu amigo, também fiz de Drummond meu parceiro de importantes reflexões, sentimentos e pensamentos inúteis.

A distância que separa Drummond do tronco é imensa: estamos em estados vizinhos de duas regiões do país. E enquanto converso com Drummond a distância, porque tenho vergonha de ir pertinho e falar com ele, percebo que Drummond está para todos à sua volta, como o tronco de meu amigo que abriga os passarinhos.

Enquanto meu amigo conversa escondido e convive com o tronco, vivo de Drummond. Em torno de toda essa história, uma coisa é certa: Drummond sente muita saudade do tronco. Eu sei, porque vejo no olhar dele a distância de quem espera e lembra.

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