...a triste e feliz história de amor de um cafajeste light por uma menina besta apaixonada...

by - março 05, 2008

ou

...uma versão soteropolitana de cinema paradiso contada por uma menina baiana apaixonada por cinema...


Ela passou e a porta se fechou levada pelo vento, lentamente, como se prezasse pelo silêncio de quem ainda não chora de saudade. Era seu primeiro dia numa terra estranha. Na noite seguinte, quando fosse dormir, ela sabia que seria um novo quarto. Tinha medo do que a solidão faria com seus desejos antigos, vivia tudo intensamente e os prazeres da última noite ainda soavam como os primeiros acordes daquele amor de menina adolescente que ela ainda não escapara.



Do outro lado da parede estavam todas as suas boas memórias. Sua recordação da família unida no hall do aeroporto, quando se deu conta de que precisava olhar mais uma vez, naqueles trinta segundos antes de entrar na sala de embarque, ainda sem a certeza de que realmente precisava passar por tudo aquilo, ela já sabia que todas aquelas relações jamais seriam as mesmas. Toto finalmente deixava a Sicília.



Ela não conversara muito com ele durante a última noite. Ele demonstrava pouco sua dificuldade de lidar com a ausência dela, mas ela sabia que ele não teria mais ninguém para curar suas crises durante a madrugada. Ele a amava, não como ela queria, mas na medida que ela precisava. Ela pedia fidelidade, ansiava por manter contato diário, sofria com a possibilidade do ciúme, sentia seu primeiro amor escorrendo pelo rosto e secando. Ele sorria, leve como quem dá nas mãos de quem ama uma rosa retirada do jardim da própria alma, leve por saber que as vidas continuam e as mudanças precisam acontecer e não poderia ser diferente, leve por enxergar nos olhos dela o reflexo daquilo que ele acreditava ser o melhor de si mesmo. Leve como quem sente a beleza de um coração disposto a amar novamente porque fora isso que aprendera ao viver sua primeira história de amor.



Ela temia o que seria dito nos últimos instantes, o que ele faria, como reagiria, tudo era sempre tão imprevisível, intenso, natural, ela admirava a direção que ele dava a cada cena acidentalmente calculada. Assim deveria ser a vida: um plano sequência filmado com base em um roteiro pensado e escrito no set de filmagem. Estava decidida. Ela reagiria em silêncio, e esperaria um beijo ao final. Mas se ele não desse, ela sorriria.



Quando se despediram pela manhã, ele ainda reagia como quem pretende ligar no dia seguinte para ir ao cinema. Antes de descer do carro ele deu um abraço e um beijo. “É tão difícil ficar sem você, O teu amor é gostoso demais, Teu cheiro me dá prazer, Quando estou com você, Estou nos braços da paz”. Foi cuidadoso com as mãos e com a boca, que é a maneira que ele utiliza para demonstrar carinho e dizer o que sente. “Nunca se esqueça, nem um segundo, que eu tenho o amor maior do mundo”. Beijou sem parar o braço dela. “Meu coração pulou, você chegou me deixou assim, com os pés fora do chão, pensei: que bom, parece enfim acordei, pra renovar meu ser, faltava mesmo chegar você, assim, sem me avisar, pra acelerar, um coração que já bate pouco, de tanto procurar por outro, anda cansado, mas quando você está do lado, fica louco de satisfação”. Abraçou ela deitada em seu colo. “Já me fiz a guerra, por não saber que esta terra encerra, meu bem querer, e jamais termina meu caminhar, só o amor me ensina, onde vou chegar”. Ela chorou assustada com o prazer e a segurança que sentia. “Me leva amor... Por onde for, quero ser seu par”.

E ela limpou os olhos, tocou os lábios dele e deu um beijo calmo. E o olhou profundamente.

Ele sorriu e disse calmamente suas últimas palavras: “Não olhe para trás. Nunca mais volte e me procure. Não ligue para mim. Ame profundamente e intensamente a si mesma. E mostre para o mundo o que uma mulher de verdade pode fazer quando sabe amar.”

Ela ganhou um último beijo. Desceu do carro calada. Ele pediu uma foto com ela dando tchau. Era uma foto triste. E ele brincava com a tristeza, na tentativa de não tornar as coisas assim tão tristes. Ele sofria muito mais do que ela. Ela sorriu e fez pose. Deu as costas e atravessou o portão.

Ele dissera tudo aquilo de forma dura e sincera, como alguém que realmente espera se tornar apenas uma boa lembrança. Ela chorava aliviada. Já sabia que aquelas seriam as últimas palavras de Alfredo. Estava a caminho da Roma tropical. Iria trabalhar com cinema, contar histórias, começar uma nova vida. Estava feliz e realizada.

O único final verdadeiramente feliz é aquele que ainda não aconteceu. E ela jamais respeitaria a previsibilidade dos 90 minutos de duração de um filme como se fosse a imponderabilidade da vida.

Posts relacionados

3 Comentários

  1. ...uma vez assisti um filme bobo, que uma moça ia realizar o sonho dela em conhecer um grande ator de Hollywood. O Ator, um fracasso amoroso como muitos hollywoodianos, que, principalmente por ela nao ter dado para ele, cai na pilha de que ela é a mulher com quem ele tem que se casar, e corre o mundo atras dela. Entretanto, já havia algum n vida dela, um amigo, daqueles, que jamais se imagina algo, daqueles, silenciosos mas de grande intensidade... os maiores amores sao assim.. quando se diz pouco ou quase nunca, eu te amo... no climax do filme... ela volta para hollywood com o Ator.. e o amigo dela..na frase clássica do filme!!" todo homem, quando perde um grande amor. tem que recomecar, mudar de vida, mudar de cidade, deixar pra traz tudo.." e vai embora... mas este filme nao é a vida. é uma comédia xarope que tem o final feliz e os dois ficam juntos no final.... A vida é diferente, muitas vezes o grande final é o como o da mocinha que vai pra Roma. Este final tem um proposito bem maior, muito maior, extrafortemente maior do que a maiora das pessoas xaropes, sao capazes de perceber.
    Muitas felicidades Baibe!!! Voce merece extrafortemente muito.. Abraco forte do seu amigo.

    ResponderExcluir
  2. Linda a história Tati! Amo ler suas histórias..Ia escrever, mas Léo já disse praticamente tudo o que eu queria dizer, e minha criatividade tá em baixa agora pra mudar o roteiro.
    Gostei de "leve como quem dá nas mãos de quem ama uma rosa retirada do jardim da própria alma". Muito lindo!
    Desejo toda a sorte que você puder ter e que a cidade maravilhosa lhe traga maravilhas..
    super beijo no coração!

    ResponderExcluir
  3. muito bom, vc escreve extraforte mesmo! abraços!
    Vilvet

    ResponderExcluir